Por Gustavo Ferreira*
Regulamentada no Brasil desde 2018, as chamadas bets – apostas esportivas on-line – faturaram R$ 54 bilhões entre janeiro e novembro de 2023, de acordo com estimativa publicada pelo jornal Folha de S. Paulo com base nas estatísticas do Banco Central. Para se ter uma dimensão desse número, o valor é maior do que o Brasil ganhou com exportações de carne bovina em todo o ano de 2023.
O setor tem conquistado seu espaço, mas é preciso alertar que o cenário traz riscos. De acordo com o levantamento da Sportradar, o Brasil teve 152 casos de suspeita de fraude em casas de apostas on-line em 2022, seguido pela Rússia, com 92 ocorrências registradas. Dados como esse indicam apostas envolvendo um grande volume de dinheiro focado em um determinado resultado, apontando que os apostadores tinham conhecimento prévio sobre o resultado do jogo, o que pode ser um indicativo de fraude.
Diante desse cenário, fica evidente a necessidade de ampliação dos mecanismos de fiscalização. Enquanto as autoridades necessitam estabelecer regras mais rígidas para aprimorar a legislação, as organizações esportivas precisam implementar ações internas em prol de uma cultura pró-ética para mitigar o envolvimento de stakeholders na manipulação dos resultados e na associação a fraudes.
A Operação Penalidade Máxima, por exemplo, deflagrada em 2023 pelo Ministério Público de Goiás, revelou um esquema de apostas esportivas envolvendo jogadores de diversos times e divisões do futebol brasileiro. Segundo a investigação, os jogadores cooptados por criminosos recebiam até R$ 100 mil para manipular o resultado do jogo por meio de ações dentro do campo, como provocar cartões amarelos ou vermelho. As casas de apostas, por sua vez, acabaram tendo de pagar altas quantias a apostadores que manipularam as partidas, além de terem seus nomes associados a esquemas fraudulentos.
Nesse sentido, as associações esportivas podem ter como aliada na mitigação de tais fraudes a implementação de uma estrutura de compliance que vai promover aos jogadores e demais envolvidos o treinamento e o conhecimento nas condutas éticas estipuladas pelo clube. Além disso, ferramentas de controle como canais de denúncia estabelecem uma forma eficiente e segura de relatar práticas suspeitas. Por fim, as denúncias podem ser investigadas e as sanções aplicadas em caso de fraudes comprovadas.
No caso dos clubes de futebol, a adoção de postura mais evoluída sobre o entendimento da gestão de riscos nos negócios já é prevista pelas SAF (Sociedade Anônima do Futebol), um modelo de clube-empresa devidamente regulamentado que prevê a implementação de ações organizacionais de auditoria em prol de sua profissionalização e, consequentemente, valorização para o mercado.
Ao passo que as bets ganham cada vez mais notoriedade no cenário econômico, a legislação precisa acompanhar esse crescimento, instituindo novos controles de combate e fiscalização à fraude. Clubes esportivos, por sua vez, não podem se omitir diante de ocorrências que deflagram a associação de seus membros a práticas criminosas de apostas. É preciso se profissionalizar e estabelecer diretrizes para uma cultura pró-ética. Só assim vamos sair da várzea empresarial esportiva!
*Gustavo Ferreira é gerente na área de Internal Audit & Financial Advisory da Protiviti, empresa especializada em soluções para gestão de riscos, compliance, ESG, auditoria interna, investigação, proteção e privacidade de dados.